Eu acreditava a 100%. Mas, quem tem a faca e o que na mão, não acreditou
Por Cérix Ramon, Gabriel Duarte, Guilherme Macedo e Guto Rabelo
“Quando falo sobre isso, falo com um bocado de mágoa e frustração, porque não queria sair. Não esperava, nem queria. Mas, pronto. É assim. Estou aqui, estou torcendo de longe para que ocorra tudo bem. E vai ocorrer.”
Pepa foi demitido pelo Cruzeiro em meio à instabilidade do time no Campeonato Brasileiro. Eram sete rodadas sem vencer, e a zona de rebaixamento ia se aproximando, após um início de briga entre os classificados para Libertadores. Apesar da ausência de vitórias, o time jogou bem em boa parte desses confrontos. Pepa esperava mais respaldo por parte da direção em meio à turbulência.
O treinador português cita que o processo seletivo que o confirmou como técnico do time, há seis meses, o fez ter segurança de que teria respaldo em momentos difíceis, em função do projeto da SAF. Segundo Pepa, a diretoria entregou tudo o que foi prometido em termos de estrutura, mas admite que faltou apoio no momento de ausência dos resultados.
– Tudo, tudo, tudo. Não me faltou nada. A única coisa que me senti foi um pouco desapoiado. Você treina o Cruzeiro, com 11 milhões de torcedores, uma paixão louca. De repente, tchau, acabou. Se fosse por confusão com jogadores, com direção, com más exibições… aí, sim. É uma grande mágoa. Da mesma forma como foi explicado sobre a força do projeto, se em algum momento acontecesse de perder por 3 a 0, chegar e falar: meus amigos, esse é nosso treinador, é ele até o final da temporada. Seja com 3 a 0, 4 a 0, 5 a 0, ele vai ser nosso treinador, porque foi escolhido e nós acreditamos.
“Só essa coisa que fica. Por que não foi feito isso? Se não foi feito, não acreditam que daria. Eu acreditava a 100%. Mas, quem tem a faca e o que na mão, não acreditou. Só tenho que respeitar. Ajudaram-me em tudo, não faltou nada, mas senti a falta de apoio. Mas, será que era falta de apoio? Talvez acharam que era melhor assim.”
Mas, qual o motivo de não ter conseguido apoio por mais tempo na direção? Pepa cita “ruídos externos”, sem explicar exatamente de quem, e considera inclusive que o rebaixamento do Valladolid na Espanha também pode ter influenciado. O clube, assim como o Cruzeiro, é gerido por Ronaldo Fenômeno.
“Os resultados não estavam sendo os melhores. Alguns ruídos externos, alguma pressão externa, ok. Não sei se pesa em quem decide, o fato de o Valladolid ter caído no ano passado. Não sei. Resultados são nossa vida. Treinador vive de resultados.”
– (…) Se com a situação dos últimos resultados, se isso criou muito ruído ou muita pressão para a decisão que foi tomada em quem decide e quem manda, isso eu não sei. Não faço a mínima ideia. Que eu estava cheio de energia, igual, eu estava. Eu estava cheio de energia, de vontade. Eu estava. Eu não tenho dúvidas de que o Cruzeiro vai atingir os seus objetivos. Minha única dúvida é se é Libertadores ou Sul-Americana. Sinceramente. A distância para a Libertadores é só um pouquinho. Não é nada do outro mundo.
Justamente em função das boas atuações do time, houve questionamento se a demissão ocorreu a partir de problemas de relacionamento com jogadores ou diretoria. Pepa foi enfático ao negar, antes mesmo de ser perguntado.
“Algumas coisas chegam aos seus ouvidos. E quando vieram me falar de mau ambiente no vestiário, é completamente mentira. E não é que há necessidade de vir aqui desmentir, mas é mentira. Ambiente fantástico com tudo e com todos, com jogadores, estrutura, direção, funcionários, segurança, porteiro, pessoal da limpeza, da cozinha, de tudo.”
– Que fique bem claro: dos jogadores que jogam menos até o mais, falavam do Wallisson, do Neto (Moura), Nikão, nada (de problema). Quando tem cobrança, tem cobrança. Quando era para ficar com jogadores, ficava com os jogadores e eu. Agora, que tínhamos um ambiente, tínhamos. Tínhamos um grupo bom, de ambiente, trabalho, exigência, era fantástico. Grupo de trabalho era muito bom.
Uma semana após a demissão de Pepa, Pedro Martins, diretor executivo de futebol, preferiu não detalhar todos os motivos da saída do treinador, mas citou questões relacionadas ao dia a dia de trabalho. Avaliação que envolveu métodos e a energia colocada nos treinamentos. O técnico português disse que não assistiu à entrevista e recebeu com espanto a declaração.
“Por opção, não vi a coletiva do Pedro. Estou a ser apanhado de surpresa. Até fico um pouco assustado com isso. Não é responder a alguém, não é uma coisa grande. Mas a gente treinava pra c*, a gente treinava muito. Aquele grupo treina muito.”
– Essas coisas do elenco é mentira. Relacionamento top. Eu, como jogador, posso achar que gosto mais daquele. Mas relacionamento saudável, top. Nós voamos. Quem não voasse ali, não teria condição. Não vou a responder, mas aquele grupo de trabalho trabalha no limite. Uma coisa é a bola entrar, não entrar, mas no nosso dia a dia só tenho que falar muito bem.
– Sim. Eu iria sentir contente se pensasse: “Esses caras estão comigo até a morte”. Se acontecesse essa situação de pedir calma, eu diria: “Estou chateado com os resultados, mas estou calmo, porque a confiança é total”. Se sentisse o grupo fugindo da mão, o ambiente ruim com os jogadores, falta de apoio da direção, eu seria o primeiro a sair. Se eu sou o problema, não a solução, eu saio numa boa. Quando eu sinto que não só sou parte da solução, como também estou com energia para agregar e fazer parte do processo. O que mais convenceu a vir foi essa estrutura, esse processo diferenciado. No momento do abalo, sentir: “Calma, estamos aqui, deixa haver o ruído, a equipe não está perdida”. Essa é a mágoa que fica.