A Vara Criminal Federal da
Subseção Judiciária de Vilhena, no estado de Rondônia, impronunciou 22 dos 23
indígenas do povo Cinta Larga acusados dos assassinatos de garimpeiros na Terra
Indígena (TI) Roosevelt em abril de 2004. Isso significa que o juiz responsável
pelo caso entendeu que a acusação não apresentou provas suficientes para
submeter os indígenas, com exceção de um, a julgamento perante o Tribunal do
Júri. A decisão é resultado do comprometimento da Fundação Nacional dos Povos
Indígenas (Funai) e da Procuradoria Federal Especializada (PFE) junto à
autarquia, em garantir aos indígenas um processo justo e equilibrado. Quanto ao
único indígena pronunciado ao Tribunal do Júri, a PFE já entrou com recurso
cabível junto ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), visando
modificar a decisão do juiz de 1º grau.
A PFE/Funai é um órgão da
estrutura da Advocacia-Geral da União (AGU) que atua na representação judicial
da autarquia indigenista, na orientação jurídica e na defesa judicial dos
direitos individuais e coletivos dos povos indígenas. No intuito de assegurar o
devido processo legal aos acusados, a Funai viabilizou o suporte necessário
para que os procuradores designados para o caso tivessem condições de trabalhar
e garantir a observância dos princípios do contraditório — direito de ser
informado e se manifestar no processo — e da ampla defesa, que é o direito de
apresentar provas e utilizar os todos os meios legais de defesa.
Vale destacar, porém, que a
impronúncia não significa dizer que os acusados foram inocentados, mas sim que,
no momento, não há indícios suficientes para que o caso seja levado ao Tribunal
do Júri. Caso surjam novas provas, o processo poderá ser reaberto, observando a
prescrição. No caso concreto, o Ministério Público Federal (MPF), autor da
denúncia, requereu a impronúncia de parte dos acusados reconhecendo a
inexistência de provas suficientes para a condenação desses réus.
A decisão é uma conquista
histórica para o povo Cinta Larga, que, por anos, recebeu o rótulo de culpado
sem que fosse comprovado o seu envolvimento no crime. Com base no princípio da
presunção da inocência, uma pessoa é inocente até que seja provada a culpa, o
que não ocorreu no caso dos Cinta Larga. O processo desconsiderou todo o
contexto de violência ao qual esse povo foi submetido devido à presença do
garimpo ilegal no território e atribuiu, sem provas, a autoria do massacre aos
indígenas.
Entenda o caso
A Terra Indígena Roosevelt é o
território de ocupação tradicional do povo indígena Cinta Larga. Localizada
entre os estados de Rondônia e Mato Grosso, no bioma Amazônia, a área sempre
foi alvo de garimpeiros devido às riquezas naturais. A incidência da
atividade criminosa no território levou doenças e violência aos Cinta Larga,
impacto que pode ser observado na redução populacional da etnia. Estima-se que
no final da década de 1960 havia cerca de 2 mil indígenas. O número caiu para
500 no início dos anos 1980. Atualmente, 958 indígenas vivem no território, de
acordo com o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
A presença do garimpo na TI se
intensificou no início dos anos 2000. Os criminosos driblavam a fiscalização
dos órgãos competentes para extrair minerais preciosos na região. Na ocasião,
cerca de 4 mil garimpeiros conseguiram entrar no território e, mesmo após serem
retirados pela Funai e pela Polícia Federal (PF), retornaram ao local. No dia 7
de abril de 2004, houve um massacre dentro da TI e 29 corpos de garimpeiros
foram encontrados. O caso teve repercussão nacional e internacional.
Em 2014, quase 10 anos após os
fatos, o Ministério Público Federal (MPF) ofereceu denúncia contra os 23
indígenas, mas não conseguiu provas para atribuir a eles a autoria do crime,
embora tenham sido condenados pela opinião pública. A Funai, autarquia indigenista
do Governo Federal, responsável por promover e proteger os direitos dos povos
indígenas, priorizou o caso para que os indígenas acusados tivessem seus
direitos assegurados.
A autarquia designou os
procuradores federais Lusmar Soares Filho e Carlos Felipe da Silva Ribeiro para
o patrocínio da defesa dos indígenas, que se deslocaram até o local dos
fatos; levantaram informações; conversaram com os acusados e reuniram a comunidade
indígena; substituíram testemunhas, requereram diligências e, ao final,
conduziram os réus até a audiência de Instrução e Julgamento, bem assim as
testemunhas de defesa; obtendo, então, a decisão judicial de impronúncia de 22
dos 23 acusados.
Assessoria de
Comunicação/Funai